Sobre as defesas de TCC que participamos (parte 3) : Pricilla Ferro




Dando continuidade aos relatos (veja os anteriores aqui e aqui) sobre as bancas de TCC, do curso de Artes Visuais - Bacharelado da UNESC, que fomos para participar, vamos conhecer agora a pesquisa da Pricilla Ferro Intitulada:


COTIDIANO E ARTE: DESCORTINANDO IMAGINÁRIOS.


Foi uma experiência muito bacana analisar e avaliar o trabalho da Pricilla, pois além de ter sido a primeira vez em que participei de uma banca de TCC, eu já conhecia a Pricilla e sua sensibilidade para as questões artísticas. Acompanhar sua pesquisa foi instigante e descobrir os caminhos de sua produção artística foi uma grata surpresa.

Com sua pesquisa Pricila tinha como objetivo encontrar no fazer artístico contemporâneo um caminho poético que provocasse a “desacomodação” do olhar dos sujeitos para com a “cidade não vista” em meio ao ritmo acelerado do cotidiano. Dentre tantos elementos da cidade não vista, ela escolheu trazer para seu estudo a população em situação de rua da cidade de Criciúma/SC.

Para tanto apresenta como problematização: de que forma é possível representar artisticamente a relação homem-mundo tomando como referência elementos da cidade não vista em Criciúma/SC e a poética de Manoel de Barros? UAU, muito legal né!?

Em busca de respostas, a pesquisa discute questões acerca da relação entre arte e cidade a partir da pré-história, relação homem-mundo, arte contemporânea e sociedade contemporânea. Desdobrando-se em outras questões pertinentes, a pesquisa nos instiga a observar aquilo que com a correria diária se torna alheio.

Um ponto super interessante na escrita da Pricilla é que ao discorrer sobre o desenvolvimento do ser humano (da pré-história à sociedade contemporânea) ela inicia falando sobre os nômades, nos dando a descrição: “Que ou quem vagueia, não tem domicílio fixo e cuja atividade é desconhecida”, e finaliza falando sobre as pessoas em situação de rua, que, se pararmos para pensar, podemos usar a mesma descrição dos nômades, não!?

Após embasar a pesquisa no que diz respeito a teoria, o desafio da pesquisadora foi encontrar uma linguagem artística que desse conta de descortinar o não visto no dia a dia e, atrair a atenção e reflexão daqueles que entrassem em contato com a produção artística, visando (re)significar, ainda que por um instante, o olhar para o cotidiano.

O foco era representar artisticamente a realidade social das pessoas que vivem em condição de rua em Criciúma, utilizando a poética de Manoel de Barros para dar visibilidade a essa questão e provocar reflexão ao expectador.

Foi aí que surgiu “Matéria para (ou)vistos”, uma intervenção-instalação.

Pricilla saiu em busca de seus personagens não vistos, visitou a Casa de Passagem São José e realizou saídas de campo pelas as ruas, durantes as madrugadas Criciumenses, onde encontrou pessoas que têm como casa os cantos da cidade. Entrevistou esses moradores de rua, coletando por meio de áudio relatos dessas pessoas, o que leva a pesquisa a objetivar reflexões mais profundas sobre o choque de realidades.

Acervo da pesquisadora

Diante de todas as narrativas coletadas, começou a materializar a forma de proporcionar ao público o alcance dessas histórias. É ai que Pricilla traz o objeto janela para a produção - não por sua forma em si, mas sim pelo seu significado simbólico e metafórico - em alusão a ideia de que o outro, por meio dela, veja através de; perceba além de. Embutidos ao objeto encontram-se um dispositivo que aciona um áudio ao abrir a janela, uma câmera webcam e micro alto falantes.

Esboço da produção artística

A janela foi instalada nos pontos da cidade que recebem um fluxo expressivo de transeuntes (Praça Nereu Ramos, Praça do Congresso e Terminal Central), inicialmente fechada, com um único enunciado em adesivo no chão que indica: “mantenha a janela aberta”, em analogia à nossa visão/percepção para os elementos da cidade não vista, sugerindo reflexões ao próprio ato físico de abrir a janela em questão.

Imagem ilustrativa da produção em espaço público

A webcam acoplada à janela é responsável por gerar as cenas resultantes da experiência. Percebendo, por meio das gravações, como o público reage ao objeto.

Os sujeitos que se propuseram a intervir no objeto artístico depararam-se com um áudio, acionado a partir da abertura da janela, por meio de um dispositivo. O áudio é composto por falas – fragmentos aleatórios - dos moradores de rua entrevistados pela pesquisadora.

Aludindo ao ato de ouvir e ver/imaginar a população em situação de rua que são materializados sinestesicamente a partir da intervenção-instalação, bem como, em referência aos neologismos propostos nas poesias de Manoel de Barros, a produção recebe o título de Matéria para (ou)vistos.

Segundo Pricilla, “Retomando ao conceito da proposta, noto que comumente, ao se abrir janelas são cenas imagéticas que se fazem fixas e transitórias por entre a abertura para outros cenários propiciados pelo objeto. Nessa produção, no entanto, a partir desse estímulo que parte da ação do outro, sendo a janela aberta, somos instigados a ouvir, possibilitando que criemos cenários imaginários que deem forma e vida a esses seres, conferindo assim, “voz” para a população em situação de rua, de acordo com Barros (2013, p. 13) “esconder-se por trás das palavras para mostrar-se.”

A produção passou por um segundo momento ao fazer parte da exposição na Galeria de Arte Octávia Gaidzinski da Fundação Cultural de Criciúma. No espaço institucionalizado de arte, Pricilla traz um vídeo, que pode ser visto através da janela, mostrando como os sujeitos reagiram à intervenção artística enquanto estava nas ruas da cidade, como também o áudio das entrevistas.

"Matéria para (ou)vistos" na galeria.

Para concluir essa postagem, gostaria de, mais uma vez, agradecer a Pricilla pelo convite, confiança e oportunidade de poder participar desse momento tão importante de sua vida acadêmica.

;)

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